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Ciência da Mecânica – Edição 01

Bem-vindos à esta nova coluna da Mecânica Online. Regularmente, irei propor questões de Engenharia Mecânica, especialmente nas áreas de Mecânica dos Fluidos e Transmissão de Calor, sempre procurando unir a teoria às práticas do dia-a-dia, visando motivá-los a aprofundar seus conhecimentos de ciência e tecnologia.

Conto com vocês para que as melhores respostas, corretas ou pelo menos as mais criativas, possam ser publicadas na coluna seguinte, com os devidos créditos, claro.

Naturalmente, seria também interessante que vocês me enviassem suas dúvidas ou mesmo questões interessantes, práticas ou teóricas, com ou sem respostas, para que sejam propostas a todos os leitores da Mecânica Online.

Novamente, as melhores serão publicadas e respondidas aqui, uma vez que não há como responder a todas. Em tempo, não tenho como responder a perguntas típicas de trabalhos acadêmicos.

Como primeira questão a ser levantada nesta coluna, escolhi uma na área de Mecânica dos Fluidos. Imagine dois carros de corrida, um bem atrás do outro. Costumamos dizer que o carro de trás está no “vácuo” do carro da frente. Isto é verdade? Há algum “vácuo” nesta história?

O conceito mais importante por trás da resposta é a existência da viscosidade do fluido, propriedade termodinâmica, que costumamos associar à capacidade do óleo do automóvel funcionar como lubrificante. Entretanto, aquela propriedade é responsável por um dos mais interessantes fenômenos que é o da separação do escoamento sobre superfícies curvas.

Para uma breve discussão, vamos supor que os carros não estejam acelerando, de forma que possamos analisar o ar escoando sobre eles, ao invés de discutirmos os escoamentos dos carros através do ar (relatividade é um fato!).

Neste exemplo, embora a explicação sirva também para qualquer outro fluido, o ar tende a acompanhar a superfície de um automóvel (novamente: de qualquer superfície). Da mesma maneira, vamos imaginar que o automóvel seja um hemisfério, uma meia laranja, para facilitar nossa análise. Ou seja, estamos modelando uma carroceria de um automóvel como um hemisfério.

Parece brincadeira isto mas você lembra daquele filme no qual o Michael Jackson desaparecia e em seu lugar, aparecia um leopardo? Pois bem, pense em alguma sucessão de eventos semelhantes para que o perfil do automóvel mude para um hemisfério.

Na parte da frente do automóvel, ao longo do “capô”, o formato da superfície é tal que o fluido consegue seguir sem problemas. Ao atingir o “teto” do carro, a velocidade do ar é ligeiramente maior que a velocidade do ar antes de atingir o automóvel.

Por quê? Como a velocidade ali é maior, sabemos que a pressão é menor (Bernoulli). Na “traseira” do carro, ao contrário, o formato é tal que o escoamento vai sendo desacelerado e com isto, a pressão na parte traseira, vai aumentando.

Se os efeitos da viscosidade fossem desprezíveis (apenas uma consideração teórica), não iríamos ter grandes problemas pela simetria ao longo do escoamento sobre nosso modelo.

Nesta situação, o tipo de escoamento antes do teto seria muito semelhante ao tipo de escoamento depois do teto. Claro, na frente há uma aceleração e na traseira há uma desaceleração, mas fora isto, o escoamento é semelhante.

A variação da pressão ao longo da carroceria seria então algo como: pressão alta, pressão baixa, pressão alta. Como podemos sempre associar a pressão a uma força, a igualdade de pressões sobre o capô e o porta malas resultaria numa força horizontal nula. Claro, esta força horizontal seria a força de arrasto aerodinâmico.

Entretanto, pela ação da viscosidade, o fluido tem dificuldades em acompanhar a superfície traseira do carro e acaba se afastando dela, no que chamamos de separação do escoamento.

Em consequência, a pressão que deveria aumentar até atingir o nível que tinha sobre o capô, não o faz, resultando em um desbalanço entre a pressão ao longo do capô e a pressão ao longo do porta malas. Isto resulta em uma força de arrasto não nula.

Além disto, a região na traseira onde a pressão deveria ser próxima à pressão sobre o capô, chamada região de separação de fluido, é uma região de baixa velocidade (pelo menos se comparada com o escoamento externo), exatamente pois o escoamento principal separou-se da superfície.

Isto faz com que o carro que está atrás não sofra a ação dos fortes ventos que atingem o carro da frente, permitindo que o de trás não gaste tanta energia (ou seja, combustível) para seguir em frente, pois não precisa enfrentar o vento.

Entretanto, como a refrigeração do motor dos carros é feita pela corrente de ar, o carro de trás não pode permanecer muito tempo nesta região, sob pena de superaquecimento.

Assim é que o piloto do carro de trás permanece naquela região, bem próxima ao do carro da frente, por um tempo necessário para ele poder ultrapassar o carro da frente, saindo do “vácuo”, mas não mais que isto.

Como vimos, o que existe na parte de trás é “apenas” uma região onde os fortes ventos que atingem o carro da frente não atingem, e portanto, não importunam o carro de trás, mas em todo e qualquer ponto desta região separada há ar, embora escoando em baixa velocidade.

Ou seja, o uso da expressão “vácuo” é um grande exagero e deveria ser evitado a todo custo. Se houvesse vácuo ali, como é que o piloto do carro de trás conseguiria respirar?

Se você entendeu esta explicação, responda agora: Por que a traseira dos ônibus que trafegam em estradas sujas e poeirentas é muito mais suja que as laterais?

A melhor resposta vai ganhar um treinamento da Mecânica Online; Para participar, basta enviar sua resposta para o email: wbraga@maua.mec.puc-rio.br com seu nome, email, cidade e estado.

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