Artigo por Kimberlin Cardoso e Edson Martinho – A ascensão dos veículos elétricos tem se mostrado cada vez mais promissora. Afinal, eles são sinônimos de uma mobilidade mais sustentável e se enquadram dentro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Prova de tamanho potencial está no estudo do Conselho Internacional de Transporte Limpo (ICCT Brasil) que demonstrou que carros elétricos podem reduzir entre 64% e 67% as emissões de gases de efeito estufa (GEE), em comparação com veículos tradicionais a combustão.
Tendo em vista este cenário, o movimento para uma adesão cada vez mais acelerada tem crescido. Dados da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) apontam que o Brasil emplacou aproximadamente 78 mil veículos elétricos entre janeiro e novembro de 2023. A Pesquisa Tendências do Consumidor, elaborada pela OLX Autos, destaca, ainda, que 4 em cada 10 entrevistados consideram a compra de um automóvel híbrido ou elétrico nos próximos anos.
No entanto, será que o país está realmente preparado para tamanha demanda? E considerando que esses veículos precisam de energia para serem abastecidos, a infraestrutura do Brasil sustenta essa operação?
O consumo de energia de um veículo elétrico – O consumo de energia de um veículo elétrico é muito alto. Para que fique mais tangível, um exemplo de comparação é o chuveiro elétrico, o qual consome cerca de 7 kWh, gasto energético de 1h de banho por dia, considerando um apartamento com seis pessoas, em que cada uma tome um banho de 10 minutos. Um carro elétrico, por outro lado, consome 22 kWh e fica cinco horas carregando. Ou seja, é 214% mais consumo de kWh, o que indica que uma carga de veículo elétrico equivale a mais de 15 dias de banho para seis pessoas.
Esse cenário deixa claro que para sustentar a mobilidade com veículos elétricos a médio e longo prazo no Brasil, é fundamental se preocupar com a criação de infraestruturas adequadas. Isso porque, caso o consumo de energia seja muito maior que o anteriormente provisionado, haverá uma sobrecarga e o transformador começará a pegar fogo.
Nesse sentido, a grande preocupação é com o dimensionamento da carga, uma vez que a alta potência de uma estação de carregamento de veículos elétricos nem sempre está prevista, tornando mais propícios acidentes como o incêndio.
Como estruturar as edificações – Essa infraestrutura exige um projeto, que deve conter estudos que chequem a necessidade de energia para suportar a demanda estimada.
Esse projeto, por sua vez, precisa ser apresentado para a concessionária, para que seja colocado um transformador adequado. Isso vale para novas construções, informando a necessidade de energia necessária, e também para reestruturações, quando há um novo provisionamento de energia.
Com tudo aprovado, vem a fase do ensaio, pensando em efetivamente agregar à infraestrutura a possibilidade de carga de veículos elétricos. Desta forma, este é o momento do teste da estação de carregamento. Essa verificação deve simular um carro para que seja avaliado se a estação está funcionando corretamente, sem déficit ou sobrecarga.
Desafios – A reestruturação de uma infraestrutura de energia elétrica para edificações, comerciais ou residenciais, é muito custosa. Ela envolve estudos e investimento em novas fiações que muitas vezes desmotivam sua realização. Isto inibe a possibilidade de veículos elétricos serem carregados, por exemplo, já que se trata de uma sobrecarga muito grande à provisionada inicialmente.
Ainda nesse sentido, muitas reestruturações são feitas apenas “dentro de casa”, o que é errado, já que, conforme mencionado acima, o ideal é desenhar ou redesenhar o projeto, apresentar à concessionária, para então prosseguir. Caso contrário, todos os investimentos internos podem não ser suficientes ou mesmo desperdiçados, caso o transformador não aguente.
Além disso, em novos empreendimentos, muitas construtoras reduzem o provisionamento de energia, que é custoso, para tornar o empreendimento mais atrativo financeiramente. Atualmente, infelizmente, muitas não têm considerado ao menos o ar-condicionado, o que torna a infraestrutura muito aquém de atender a demanda de veículos elétricos.
Esse reflexo já é real e pode ser observado. O aumento do consumo de ar-condicionado no verão tem causado uma série de explosões em transformadores, como amplamente noticiado nos últimos meses. Em infraestruturas como essa, se houvesse uma sobrecarga oriunda do carregamento de um veículo elétrico, o impacto poderia ser ainda pior.
Possibilidade de apagão – Quando o assunto é o alto consumo de energia para carregar veículos elétricos e a prova de que a infraestrutura do Brasil ainda não é a ideal, o próximo passo é pensar em um possível apagão.
O sistema de distribuição de energia no Brasil é muito bom. Se der problema em uma usina, outra consegue atender à demanda dela, justamente por ser tudo interligado. Já passamos por momentos mais delicados, de possibilidade de falta de energia, mas atualmente, o apagão só ocorreria se houvesse falha no gerenciamento de distribuição, como o que ocorreu em 2023.
No entanto, diante da demanda que cresce a cada dia mais, a energia elétrica pode sim se tornar escassa, o que movimenta o mercado a pensar em fontes de energia renováveis. Essa é uma pauta amplamente discutida e que tem trilhado um caminho muito promissor e necessário para suportar a demanda ao longo dos próximos anos.
Em suma, o Brasil tem conseguido sustentar o carregamento de veículos elétricos, mas isso não se sustentará por muito tempo. Daí a necessidade de pensar nisso agora e projetar os edifícios já considerando novas demandas de energia como essa.
Kimberlin Cardoso é Especialista de Marketing de Produtos na Fluke do Brasil, companhia líder mundial em ferramentas de teste e medição presente em diversos segmentos da indústria. Edson Martinho é CEO da Abracopel e Coordenador Pedagógico na Fluke Academy.