A demissão por justa causa de um motorista de caminhão que publicou vídeos de manobras arriscadas no TikTok foi confirmada pelo TRT-MG, gerando uma importante reflexão sobre o mau uso das redes sociais. A decisão judicial ressalta a importância da confiança na relação empregatícia e a responsabilidade do trabalhador perante a imagem da empresa. No entanto, o caso contrasta com a realidade dos influenciadores digitais, que frequentemente exibem comportamentos perigosos no trânsito sem sofrer punições proporcionais, expondo um descompasso ético e legal que merece atenção.
A Justiça do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG) validou a demissão por justa causa de um motorista de caminhão, que, sob regime CLT, foi desligado da empresa por publicar em seu perfil do TikTok vídeos de manobras perigosas com o veículo. A decisão reforça que o mau uso das redes sociais pode ter consequências severas para a vida profissional, especialmente quando a conduta do empregado afeta a imagem e a reputação do empregador.
O julgamento destaca que a confiança é um pilar essencial da relação de trabalho. Quando um empregado associa a imagem da empresa a comportamentos imprudentes, ilegais ou de risco, essa relação é comprometida, o que legitima a aplicação de sanções disciplinares, como a demissão por justa causa.
A advogada Silvia Monteiro, sócia da área trabalhista do Urbano Vitalino Advogados, um dos maiores escritórios fulll service do Brasil, avalia que a decisão reforça a necessidade de as empresas manterem políticas claras sobre o uso de redes sociais. “A justa causa é a penalidade mais severa aplicada em um contrato de trabalho e só deve ocorrer em situações de gravidade”, diz a advogada. “O TRT-MG entendeu que houve quebra de confiança, porque a exposição pública de condutas inadequadas em redes sociais afeta diretamente a imagem e a reputação da empresa.”
Silvia acrescenta que o caso traz um alerta importante para empregadores e empregados. “Para as empresas, é fundamental reforçar treinamentos internos e implementar políticas de compliance digital, deixando claro quais condutas são vedadas. Para os trabalhadores, fica a lição de que o uso das redes sociais, ainda que em contas pessoais, pode gerar repercussões jurídicas sérias no ambiente de trabalho.”
A decisão serve como um alerta para a importância das políticas internas claras nas empresas sobre o uso das redes sociais. É fundamental que os colaboradores entendam os riscos de associar sua vida pessoal na internet a condutas que possam prejudicar a imagem de seu empregador, especialmente em atividades que envolvem segurança, como é o caso de um motorista profissional.
No entanto, o caso emblemático julgado pelo TRT-MG revela um paradoxo social: a punição de um trabalhador CLT por uma conduta imprudente nas redes sociais contrasta com a situação de muitos influenciadores digitais, que igualmente fazem do trânsito seu “local de trabalho” e, frequentemente, exibem e monetizam comportamentos de risco sem sofrer consequências legais proporcionais.
Enquanto o motorista foi punido por comprometer a imagem de seu empregador, muitos criadores de conteúdo obtêm patrocínios e notoriedade ao exibir comportamentos ilegais, como dirigir em alta velocidade, praticar “rachas”, realizar manobras perigosas ou usar o celular ao volante. Esse cenário levanta a questão da responsabilidade social e da isonomia na aplicação da lei.
O Código de Trânsito Brasileiro já prevê infrações gravíssimas para a maioria dessas condutas. A diferença, no caso do trabalhador, é a existência do poder disciplinar do empregador, que pode impor uma punição mais severa e imediata, como a perda do emprego.
O julgamento do TRT-MG reforça um ponto crucial para a sociedade: as vidas não podem ser usadas como moeda de troca por engajamento ou “curtidas”. As autoridades e a sociedade devem fiscalizar com o mesmo rigor os influenciadores e criadores de conteúdo que banalizam a imprudência no trânsito.
E, ainda apesar de tudo isso, há assessorias de imprensa e marcas que continuam valorizando e contratando esses influenciadores, seja para campanhas publicitárias, seja para ações promocionais, alimentando um ciclo de incentivo indireto a comportamentos imprudentes. Em vez de repudiar tais condutas, parte do mercado publicitário acaba transformando em negócio práticas que deveriam ser combatidas.
O episódio julgado pelo TRT-MG serve, portanto, como alerta para todos:
- Para empresas e empregados, sobre os riscos do mau uso das redes sociais e a importância de políticas internas claras;
- Para autoridades e sociedade, sobre a necessidade de fiscalizar com o mesmo rigor influenciadores que banalizam comportamentos perigosos no trânsito;
- Para marcas e assessorias, sobre a responsabilidade social de não patrocinar condutas ilegais.
Se um trabalhador pode perder seu emprego por quebrar a confiança e colocar vidas em risco, influenciadores e patrocinadores também precisam ser responsabilizados — legal, ética e socialmente. Vidas não podem ser moeda de troca por curtidas ou engajamento.
O caso demonstra que o mau uso das redes sociais não é uma questão exclusiva do ambiente corporativo, mas um problema sistêmico que envolve trabalhadores, influenciadores e marcas. A tecnologia ampliou a visibilidade dos atos, mas não eliminou a responsabilidade individual e institucional sobre eles.
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CLT – Abreviatura de Consolidação das Leis do Trabalho, que é o conjunto de normas jurídicas que regulamenta as relações de trabalho no Brasil, estabelecendo os direitos e deveres de empregados e empregadores.
Justa causa – Tipo de demissão que ocorre quando o empregado comete uma falta grave, quebrando a confiança e a boa-fé que fundamentam a relação de emprego.
TikTok – Aplicativo de mídia social para criação e compartilhamento de vídeos curtos.
Paradoxo – Conceito que indica uma contradição ou uma aparente incoerência que, ao ser analisada, pode revelar uma verdade ou um descompasso.