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Ascensão e Queda do Etanol no Brasil: um combustível que poderia ser internacional

Por José Alexandre Altahyde Hage (*)

Nossa intenção com este breve texto é analisar assuntos importantes para o Brasil: o papel que o álcool combustível ocupa na história recente, sua utilização e crise, pela qual vem passando desde 2010, se for possível citar data para fins pedagógicos ou por conveniência de compreensão.

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Como surgiu o chamado etanol, como é mais conhecido na atualidade, e como ele pode interagir na economia internacional, apesar de sua “carbonização”?

Isso porque a premissa de que haverá forte descarbonização da economia internacional, utilizando menos petróleo e carvão mineral, é algo que poderá ocorrer em um futuro que ainda não está à vista.

Por serem mais dinâmicos na exploração e na logística, os combustíveis fósseis serão utilizados pelos maiores países industrializados, ou mais que industrializados, por mais alguns anos.

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Arriscar quanto tempo essa realidade perdurará pode ser atraente para o campo da especulação, mas de pouca utilidade para investigações mais acuradas.

A conveniência dos hidrocarbonetos ocorre, como foi mencionado acima, pelo acúmulo de experiência em operação que os países, bem como empresas especializadas, apresentam para sua exploração.

Apesar de o valor do barril de petróleo oscilar perto de 100 dólares há alguns meses, promovendo carestia no custo de vida em boa parte do sistema econômico mundial, a possibilidade desse custo abaixar para menos de 80 dólares é possível.

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Isso pode acontecer desde que as cadeias mundiais de produção venham a se equilibrar e entrar em regularidade, que a China (em primeiro lugar) possa retomar sua produção industrial em grande monta e que os países produtores de petróleo possam ter normalidade de produção, sem sofrer abalos por riscos políticos em virtude de guerras internacionais.

Não há dúvida de que parte substancial na alta do barril de petróleo nas praças financeiras, Londres e Nova York, obedece também ao dramático clima decorrente da atual guerra entre Rússia e Ucrânia, pela suspensão de petróleo e gás natural russos nas negociações internacionais de energia, pela “autofagia” que a União Europeia entrou em prol de algo com pouca consistência econômica e eficiência energética, chamada “green power”, na qual o Velho Mundo abre mão da regularidade e barateamento dos hidrocarbonetos, e de energia nuclear, para dar vazão a sentimentos considerados nobres e virtuosos, ligados a movimentos ambientais sem ligação suficiente com as reais condições de vida de setores sociais menos aquinhoados. Eis alguns motivos da carestia internacional.

Apesar de apresentarmos cena na qual os hidrocarbonetos imperam, por outro lado, não significa dizer que não haja espaço para demais geradores de energia, sobretudo renovável.

Investimentos têm sido encontrados em vários países que promovem crescimento de energia eólica, por exemplo, para diversificar suas matrizes energéticas.

A amostra mais evidente tem sido a China, cujo interesse na diversificação de sua matriz, já bem alimentada por hidrocarbonetos e nuclear, a leva a investir em fornecimento pela energia dos ventos.

Em uma combinação de interesses por maior exportação de commodities, com alto valor agregado, e por possível tomada de nova industrialização (ou neoindustrialização), o Brasil, entre alguns países interessados no tema, pode ter lugar de destaque pela produção de etanol de cana de açúcar.

O emprego do álcool combustível brasileiro tem condições de promover efeitos positivos na economia nacional, desde que seja acompanhado de projeto coerente de desenvolvimento e de planejamento estratégico, ferramenta que infelizmente não é encontrada na inteligência brasileira há algumas décadas.

Criado pelo governo federal no período entre 1975 e 1979, o álcool combustível resultou, entre outros, de estudos de José Walter Bautista Vidal, que integrou o Programa Nacional do Álcool (Proálcool) e que chegou a gozar de algum sucesso na sociedade brasileira ao lançar carros populares, com preços reduzidos por incentivos governamentais.

Os carros a álcool, contando com motores entre 1.000 e 1.600 cilindradas, custavam mais baratos que os movidos a gasolina, pois acreditava-se que o Brasil conseguiria substituir parte substancial da importação de petróleo, e seu alto valor em dólar, pelo uso do etanol de cana de açúcar, ação que contribuiria para o balanço nacional de pagamento, uma vez que o Brasil poderia despender menos recursos na importação de óleo.

E vale a pena citar que estávamos na segunda crise de abastecimento, por conta da guerra entre Irã e Iraque, na qual o valor do barril chegava a 40 dólares, em comparação aos 12 dólares da crise de 1973.

Assim, o que parecia ser projeto bem-sucedido, apesar de determinados erros de concepção, teve interrupção, ou forte diminuição, a começar o governo de Collor de Mello, em 1990, cuja opinião era a de que o país não deveria subsidiar combustível, uma vez que o valor internacional do barril de petróleo estava entre dois e três dólares em função da alta produção que havia nos países do Oriente Médio, da ex-União Soviética e do Mar do Norte. Se havia muito petróleo barato, por que subsidiar algo que na produção era mais caro?

O raciocínio daquele mandatário, assim foi ventilado à época, era o de que o governo não poderia promover transferência de renda para um setor que historicamente é rico: usineiros.

E o que também se observava era a queixa que esses empresários apresentavam ao poder público, para que dessem mais dinheiro para produzir etanol, caso contrário eles prefeririam usar o suco da cana para produzir açúcar para exportação e assim ganhar mais.

Pelo sim ou pelo não, a produção de etanol no Brasil despencou e não se recuperou mais nos anos 1990.

Proprietários de carro a álcool tiveram que se desdobrar para não pararem ou se desfazer de seus veículos o mais rápido possível.

Afinal, quem iria querer carro sem garantia de combustível? A perturbação acabou no ano de 2002/2003, com o aparecimento do carro flex, com o qual o consumidor poderia escolher entre álcool ou gasolina, conforme a circunstância.

A partir daquele ano houve entusiasmo pela produção de etanol e pela ampliação do parque sucroalcooleiro no Brasil.

Novas usinas foram montadas em São Paulo, Pernambuco, Goiás e Paraná. Parecia que o setor entraria novamente em período promissor.

O Brasil chegou a empatar com os Estados Unidos na produção de etanol, sendo que o renovável nacional é melhor que o estadunidense, por ter maior balanço energético.

Necessita-se de uma unidade de energia para obter entre sete a nove com etanol; já no similar de milho, dos Estados Unidos, a contabilidade é de um para três ou quatro.

Como foi mencionado acima, o problema da retomada do etanol no Brasil não obedeceu a critérios de planejamento estratégico, erroneamente confundido com intervenção governamental em prejuízo do setor privado.

Aquela retomada foi resultado do humor que determinados governantes tiveram em seus mandatos.

Por isso, com o fim de seus governos, findou-se também o plano de o Brasil ser exportador de energia renovável, uma vez que não havia plataforma de regularidade que conservasse o que havia sido feito até então.

A partir de 2010 a produção de etanol despencou mais uma vez, para níveis dos anos 1990; já a produção estadunidense escalou muito e se distanciou ainda mais do Brasil.

A falta de planejamento estratégico por parte da elite governante e empresarial do país pode ser observada pela ausência de plano regular de produção, de estudos sobre contratempos e possibilidades da cultura e pela ausência de combinação de interesses com demais atores.

Por ser combustível renovável e relativamente limpo, sem grande emissão de CO2, o álcool poderia ser nosso grande ato na ampliação do já competente agronegócio.

O emprego de planejamento estratégico poderia ocorrer, entre outras coisas, no empenho de internacionalização do produto para concorrer com combustíveis de menor balanço energético e mais caros na produção, caso não somente do álcool de milho, mas também da beterraba branca dos europeus.

O problema de fundo é que no mercado internacional de energia o jogo costuma ser duro e pesado.

Os países mais fortes politicamente defendem muito seus interesses: Estados Unidos e União Europeia.

Essas potências buscam dificultar a importação de etanol do Brasil por meio de barreiras alfandegárias, sanitárias e, por fim, por propaganda contra a produção do Brasil, ao lançarem imagem de que sua cultura desmata a Amazônia e ocupa terrenos agrícolas que deveriam ser utilizados para a necessária produção de alimentos.

Eis o impasse. A necessidade de haver combinação de interesses entre Estado e empresários é fato.

De igual modo, também se faz necessário projeto de articulação de defesa no etanol nas negociações internacionais com intuito de neutralizar suas ações que procuram prejudicar o produto nacional.

Trata-se de problema político, diplomático, que temos que resolver para lançar combustível que além das vantagens apresentadas pode contribuir para a retomada de industrialização, de mecânica pesada, de metalurgia, caminhões, locomotiva, entre outras, no Brasil.

Isto porque a retomada do parque sucroalcooleiro no país depende de regular produção industrial, sem a qual a movimentação de usinas, satisfatoriamente, não acontece.

Seria mais produção, mais pagamento de impostos, mais impacto positivo na economia regional e mais criação de empregos para boa parte das formações: de técnicos a engenheiros, agrônomos, mecânicos eletricistas em geral; para motoristas de caminhão, tratoristas mais especializados, químicos, especialistas em caldeira, moendas e demais profissões em busca de emprego em um Brasil que necessita se encontrar com sua sociedade.

Além disso, o Brasil poderia usar o assunto etanol, combustível renovável, para retomar tema que ficara em suspenso há mais de quinze anos: a possível articulação diplomática entre Brasil, Índia, alguns países da África e possivelmente China para a criação de nova economia verde, com novos valores e concepções em prol dos países em desenvolvimento.

Sem querer confrontar os membros do hemisfério norte, o etanol poderia ser o cimento de cooperação para os países do hemisfério sul em busca de participação com maior afinco.

(*) José Alexandre Altahyde Hage é professor do Departamento de Relações Internacionais da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (Eppen) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) — Campus Osasco

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