Por Roberto Matarazzo Braun*
A indústria automotiva é um dos setores que mais foi afetado pela imprevisível pandemia de covid-19.
Tivemos suspensões das atividades produtivas para proteger a saúde dos nossos colaboradores, redução de salários e jornada para preservação dos empregos, novas medidas de distanciamento e higienização de equipamentos, diminuição de margem devido à alta do dólar, risco de falta de matéria-prima e expressiva redução nas vendas de veículos, apenas para citar alguns dos principais desafios.
Todos esses fatores afetaram sobremaneira o nosso planejamento. Isso já representa muito, mas ainda tem mais.
Eu explico. Recentemente, foi aprovada na Câmara dos Deputados e, na sequência, no Senado, a Medida Provisória 987/2020, que prorroga o incentivo fiscal federal para as indústrias automotivas localizadas na Região Centro-Oeste.
Para completar o processo legislativo e entrar em vigor, ela ainda precisa ser sancionada pelo Presidente da República.
E, assim, um incentivo que era para durar incialmente por 10 anos, já está em vigor há duas décadas e agora, a dois meses do seu término, pode ser novamente estendido por mais cinco anos.
A extensão desse benefício federal é questionável, considerando que o prazo de vigência do regime já teria sido suficiente para a recuperação de investimentos realizados e a extensão do prazo por mais cinco anos dificilmente atrairá novas montadoras, com atração de investimentos e geração de empregos expressivos para a região.
Também não há por que se falar da necessidade de compensação de custos logísticos, uma vez que a região Centro-Oeste é considerada localização ideal para a instalação de centros de distribuição de alcance nacional.
Essa medida afeta diretamente a previsibilidade das empresas localizadas em outras regiões do Brasil, impactando diretamente os investimentos já realizados e afastando os novos, pois o empresário precisa de cenários claros para investir com segurança.
Trata-se de um jogo de soma com resultado negativo, uma vez que gera alguns empregos automotivos na região incentivada, mas fecha empresas e destrói empregos e renda nas outras regiões do País, comprometendo o presente e o futuro.
O prazo entre a concepção, o desenvolvimento e o lançamento de um veículo é de cerca de cinco anos.
O plano de negócios considera o valor investido e o retorno com as vendas futuras, estimando volumes e preços de vendas do produto da empresa e dos concorrentes do mesmo segmento.
O incentivo regional traz um desequilíbrio nesse cenário de competição, na medida em que pode ser utilizado para redução de preços e aumento de volumes de vendas não previstos no plano de negócios original.
A falta de previsibilidade traz muitas incertezas para o plano de negócios de empresas do setor automotivo, mas afeta igualmente qualquer setor, seja indústria, comércio ou serviços.
Trata-se de mais um caso de ausência de estabilidade nas regras, ou seja, risco regulatório, com repercussão internacional, afetando a imagem e a atração de novos investimentos para o Brasil.
Hoje a indústria automotiva carece de uma política igualitária para todas as empresas.
Entretanto, até o momento, a previsibilidade parece cada vez mais distante. Os ganhos de curto prazo são parciais (e apenas para alguns).
Os de longo prazo, no entanto, ficam cada vez mais distantes e prejudicam a todos. Esperamos que a reforma tributária seja rapidamente concluída e aprovada, corrigindo essas distorções e oferecendo a necessária previsibilidade, esta sim que permite a atração de novos investimentos, geração de empregos e renda em longo prazo, tão necessários ao desenvolvimento de nosso País.
*Roberto Matarazzo Braun é diretor de Assuntos Governamentais da Toyota do Brasil.