Se você comprou um carro usado ou — mesmo se primeiro dono — não tem acompanhado os anúncios de recalls na imprensa, fique atento: ele pode estar incluído em alguma operação do fabricante. As últimas anunciadas no Brasil foram:
Palio: toda a linha 1.000 (incluindo hatch, Siena e Weekend) e também o picape Strada, fabricados de maio de 1998 a agosto último (cerca de 320 mil unidades), devem ter instaladas peças de reforço na ancoragem dos cintos de segurança dianteiros para evitar sua soltura em um acidente. Serviço estimado em 15 minutos em concessionária.
Corsa: qualquer versão, motorização, carroceria ou procedência (São José dos Campos, São Caetano do Sul, SP, e Rosário, Argentina), fabricado até dezembro de 1999 (mais de 1,3 milhão de veículos), e também o esportivo Tigra, importado da Espanha em 1998 e 1999 (cerca de 4.000 unidades). A falha pode soltar os cintos de segurança em eventual colisão. Um reforço é adicionado à ancoragem, em serviço gratuito e estimado em 20 minutos pela GM.
Golf e A3: ambos os modelos, produzidos este ano no Brasil, podem exigir substituição do braço da suspensão dianteira. Falha na solda pode levar à soltura do braço, com risco de perda do controle do carro. A VW alega que o defeito é progressivo e que ocorre ruído antes da soltura. São 28 mil unidades, metade delas exportada.
Já as grandes marcas efetuam nos veículos nacionais amplos testes de durabilidade, onde o veículo é colocado à toda prova, rodando normalmente em torno de 100.000 km em condições severas de utilização. Não há notícias de que os importados para o Brasil tenham passado por teste similar para rodar por aqui.
Problemas de estabilidade causaram acidentes também com o Audi TT, que ganhou suspensão modificada e spoiler traseiro. Mas muitos usuários preferiram não adotar o defletor, para não perder estilo em favor da segurança
Fogo no Tipo – Um dos casos mais conhecidos de má adaptação às condições brasileiras foi do Fiat Tipo, que teve mais de 40 incêndios entre os anos de 1995 e 1996, muitos deles com destruição total e prejuízos a terceiros.
No primeiro recall a Fiat atribuiu o problema ao tubo condutor do ar quente para o filtro de ar, que estaria sendo danificado por lavagens do motor com produtos químicos e pelo clima quente de certas regiões.
Como o problema não se resolveu, a Fiat partiu para uma solução efetiva. Em uma segunda chamada foi reparada a tubulação hidráulica do sistema de direção assistida, que permitia vazamento de fluido sobre o coletor de escapamento e outras partes quentes junto ao motor, sobretudo quando o carro era estacionado com o volante muito esterçado.
A Fiat quis convencer que o problema do Tipo era a lavagem do motor com produtos químicos… A falha, na verdade, era na tubulação da direção assistida
Ao que parece, o problema foi resolvido. A associação criada para defesa das vítimas, Avitipo, ganhou na Justiça e os casos serão indenizados um a um. Mas a imagem do carro no mercado estava já bastante desgastada, com grande desvalorização dos modelos e a condenação do modelo nacionalizado, produzido em Betim, MG.
As campanhas de recall podem ser corretivas ou preventivas. Em muitos casos a montadora convoca os proprietários para efetuarem reparos ou troca de peças que não colocam a vida dos ocupantes em risco. Foi o caso da Mercedes, que convocou proprietários do Classe C para a troca do fecho do capô, que poderia se abrir parcialmente com o carro em movimento. A peça custa em média US$ 10, mas a Mercedes fez isso porque apenas sete carros apresentaram o problema.
Acusa-se a Mitsubishi de esconder, no Japão, documentos com defeitos de diversos modelos, incluindo o Lancer vendido aqui
Em contrapartida, recentemente a Volvo diagnosticou a deficiência no sistema de suspensão de 116 mil unidades do sedã S80 e da perua V70 e iniciou um recall na Europa, mas a empresa no Brasil vai esperar mais informações da Suécia. Ocorre, assim, certa morosidade para resolver o caso, já que o defeito é apresentado quando o veiculo trafega em terrenos acidentados e no Brasil terreno acidentado é o que não falta.
Essa demora em iniciar a campanha não é privilégio da Volvo. A maioria das fábricas leva meses — ou até anos — para definir alguma estratégia de recall. No Japão, o Ministério dos Transportes estuda abrir um processo contra a Mitsubishi, acusando-a de esconder documentos há mais de 20 anos que mostravam defeitos em diversos modelos da marca, inclusive Lancer e Galant, também vendidos no Brasil. O presidente da empresa já pediu demissão por conta do caso, a exemplo do da Bridgestone-Firestone.
Golf e Audi A3 brasileiros saíram com falha nos braços da suspensão dianteira: risco de perda de controle, como no recall anunciado tempos atrás para o Astra
Ainda no problema dos pneus, a Ford acusa a Bridgestone de ter conhecimento do problema há mais de três anos — mas comenta-se que a própria Ford sabia do problema há mais tempo, sem também tomar uma atitude. E a GM está na mira de entidades de defesa do consumidor, que analisam se ela já sabia do defeito dos cintos do Corsa há um ano e meio, já que houve tempo de melhorar o sistema já na linha 2000.
Recall sempre indica alguma falha, mas não é privilégio de carros problemáticos nem indicativo de baixa qualidade. A Rolls-Royce, que dispensa apresentações, detectou há algum tempo defeito no termostato do sistema de aquecimento dos bancos, que estava permitindo temperatura muito elevada. Seja por um grande risco ou por um inconveniente quase imperceptível, o recall demonstra atenção e respeito ao consumidor. É sua satisfação e segurança que estão em jogo.