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O sol é o limite

Olá! Mês passado propus uma questão sobre o potencial de utilização de energia solar para a produção de energia elétrica na Terra. Este mês, como usual, irei comentá-la.

A seqüência de comentários que se segue é baseada na Teoria dos Grandes Números, com freqüência chamada de Análise de Ordem de Grandeza. A idéia é termos uma idéia do tamanho da coisa e não acertarmos a “resposta certa”.

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Lembram-se das velhas questões dos exames vestibulares do tipo: “quantos litros de água cabem no Maracanã?” ? Pois é, elas servem para muitas coisas.

O primeiro passo na nossa trajetória é a determinação da quantidade de energia que chega à nossa porta, que é o limite superior da atmosfera da Terra.

No final do século XIX, Wien, colega de Planck, chegou à conclusão que havia uma relação entre a temperatura de um corpo negro e o comprimento da máxima emissão de energia do mesmo. Esta relação, conhecida como lei do deslocamento de Wien, é tal que:

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De posse de medições feitas na Terra que indicam que a emissão do Sol é máxima para, obtemos que a sua temperatura aparente é de aproximadamente 5800 K, bastante quente, certamente.

Esta é a temperatura superficial do Sol. Dentro dele, a temperatura é evidentemente, muito maior. Da Radiação Térmica, sabemos que o poder emissivo total de um corpo negro é expresso pela lei de Stefan-Boltzmann.

Observando que o raio do Sol é de 695 mil quilômetros e aproximando-o como uma esfera, obtemos que a potência emitida pelo Sol é da ordem de 4 x 1026 Watts, o que é uma imensa quantidade de energia.

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Felizmente, esta energia é enviada radialmente em todas as direções. Desta forma, a energia por unidade de área na órbita da Terra, distante cerca de 150 milhões de quilômetros do Sol é bem menor: 1378 W/m2.

Esta é a quantidade que chega à atmosfera da Terra, incidindo perpendicularmente à superfície. Nesta situação, a energia que incide no disco cujo raio é o da Terra vale.

O que é uma quantidade razoável para a Terra mas mínima para o Sol (inferior a 5×10-8 % da energia emitida pelo Sol).

Considerando que a Terra gira, chegamos a um valor médio para esta energia, se dividirmos pela área da esfera da Terra, o que nos dá um valor médio de 344 W/m2. Esta é a quantidade de energia que na média chega à borda da atmosfera da Terra.

Aproximadamente um terço desta energia é imediatamente refletida de volta para o exterior, pelas nuvens, pelo mar, etc, sem qualquer interação com a atmosfera. Ou seja, temos livre cerca de 230 W/m2 para aquecer a atmosfera e o solo.

A experiência indica que a atmosfera absorve cerca de 70 W/m2 da radiação de ondas curtas provenientes do Sol, reduzindo para uns 160 W/m2 a parcela que alcança de fato o solo. Assim, para a Radiação proveniente do Sol, temos na média que:

energia chegando na média em cada m2 da superfície = energia diretamente refletida pelas camadas superiores da atmosfera + energia que é absorvida pela atmosfera + energia que chega à superfície da Terra proveniente do Sol

o que significa:

A situação fica um pouco mais complicada e talvez interessante pois a atmosfera e a própria Terra emitem radiação.

No caso da Terra, a energia emitida pode ser também calculada pela lei de Stefan-Boltzmann, considerando que a temperatura média de uns 288 K (cerca de 15 C).

Em conseqüência, se tivermos cerca de 230 W/m2 para aquecer a atmosfera e o solo mas o solo emitir para a atmosfera cerca de 390 W/m2, no espírito do efeito estufa, podemos dizer então que a atmosfera captura cerca de 160 W/m2, o que é uma quantidade imensa de energia. Utilizando o argumento de Z.

Wasrhaft, em seu livro “Thermal-Fluid Engineering”, Cambridge University Press, 1997, isto significa uma lâmpada de 160 W colocada em cada metro quadrado de área da Terra!

Pare um minuto e imagine o “tamanho” de uma área de 1 metro de largura por 1 metro de comprimento! Provavelmente, isto assaria todo ser vivo deste planeta. Assim, há outras coisas em jogo.

Pela lei de Stefan-Boltzmann, a atmosfera que já absorveu 70 W/m2 provenientes do Sol, está a uma temperatura média de 3 C e portanto também emite radiação. O valor calculado para a energia que ela emite para a Terra é da ordem de uns 330 W/m2. Isto é, um balanço de energia para a atmosfera nos dará:

energia absorvida do Sol + energia capturada pelo efeito estufa – energia emitida para a Terra = Saldo (ou déficit) de energia radiativa

ou seja:

Isto é, nestas contas, a atmosfera estaria se esfriando neste processo. Entretanto, como veremos, há outras parcelas em jogo. Mas antes de prosseguir, vejamos o Balanço de Radiação para a Terra.

energia radiativa recebida da atmosfera + energia radiativa recebida do Sol – Energia emitida (radiação) = Saldo (ou déficit) de energia radiativa

Se a Radiação fosse a única parcela envolvida, a Terra estaria se aquecendo. Levando em contas as incertezas associadas, os dois números acima devem ser vistos como equivalentes, de mesma ordem, não como exatamente iguais. Mas vejamos as próximas etapas.

A energia que chega à Terra vinda diretamente do Sol (160 W/m2) não incide perpendicularmente à superfície da Terra durante o dia todo, pois pela manhã bem cedo e à tarde, a inclinação dos raios solares é bastante grande.

Supondo um ângulo médio de 45 graus, nossa estimativa se reduz para 113 W/m2 (= 160 cos 45).

Como todo processo tem suas perdas, vamos supor que a eficiência do nosso processo de conversão de energia solar em energia elétrica seja de 15%, utilizando dados de John Shonle no seu livro “Environmental Applications of General Physics”, publicado pela Addison-Wesley em 1975. Assim, teríamos cerca de 17 W/m2 para serem convertidos em eletricidade.

Precisamos saber então qual é a área que poderemos usar para a usina solar. Segundo Shonle, este número é da ordem de 2,5×1013 m2, desprezando as áreas habitadas, industriais, agrícolas, montanhosas, etc. Isto nos permite obter como estimativa de potencial elétrico o valor:

As necessidades atuais do mundo são hoje da ordem de 1013 W. Vemos assim que o potencial solar é da ordem de 40 vezes maior que as necessidades do mundo. Isto é, o processo de conversão dos raios solares em energia elétrica é um processo irreversível no mundo, face ao seu potencial.

Mais cedo ou mais tarde, precisaremos olhar melhor esta gigantesca fonte de energia. Hoje ele é ainda de reduzida aplicação face aos custos. Entretanto, com o eventual e também irreversível término do petróleo, os custos passarão a ser competitivos.

Para finalizar este estudo, vejamos como a natureza gerencia o fato da atmosfera estar perdendo 100 W/m2, o que significa estar ela se esfriando, e a Terra estar ganhando 100 W/m2, isto é, se aquecendo, como vimos acima.

Até este ponto, consideramos apenas a influência da Radiação Térmica na atmosfera. Entretanto, um outro fator bastante importante é a imensa evaporação da água dos mares e rios, o que acontece continuamente.

Lembrando o valor da entalpia de vaporização, da ordem de 2400 kJ/kg (consulte uma tabela de propriedades termodinâmicas), e considerando que a precipitação anual de água (isto é, chuva!) na Terra é da ordem de 5×1017 kg (os oceanos contem cerca de 1021 kg de água), temos que a evaporação desta massa de água consome cerca de 3,8×1016 W.

Considerando os 230 W/m2 que penetram na atmosfera provenientes do Sol, temos que a parcela de energia chegando à Terra é da ordem de:

ou seja, a energia associada à evaporação da água é cerca de 32% da energia do Sol que penetra na atmosfera da Terra.

Certamente, uma parcela considerável. Esta quantidade de massa evaporando retira esta energia do próprio sistema, resfriando a Terra e esquentando o ar.

Se dividirmos a energia consumida na evaporação pela área superficial da Terra, obteremos que cerca de 75 W/m2 são retirados da Terra e transferidos para a atmosfera.

Uma outra parcela é utilizada para movimentar a atmosfera, que pode ser estimada nos 25 W/m2 restantes. Com isto, chegamos aos 100 W/m2 que estavam faltando.

Como podemos ver, não há equilíbrio radiativo entre a Terra e a atmosfera mas há uma possibilidade de equilíbrio se envolvermos convecção.

A situação é frágil pois não entendemos tudo o que se passa. Por exemplo, se o efeito estufa aumentar, como resultado da maior emissão de CO2, etc, a atmosfera irá emitir mais energia para a Terra, que aumentará a evaporação da água que provocará mais nuvens e talvez alterando a quantidade de energia absorvida pela atmosfera que por sua vez, …. Muito complicada esta análise pois um mecanismo alimenta outro, numa seqüência de ajustes.

Um último ponto interessante é o dado que estas trocas não acontecem uniformemente pela Terra, pois a evaporação é grande nos oceanos e mínima nos desertos, o gelo dos pólos reflete muito a radiação infravermelha, etc.

Além disto, os valores discutidos aqui, além de serem aproximados, variam na presença de nuvens, tornando o problema muito mais complexo.

Isto é apenas um indício do complicador efeito da latitude e da longitude das regiões da Terra nas condições climáticas do planeta. Entretanto, estas “complicações” nos afetam diretamente e estudá-las é um dos problemas mais importantes deste século.

Para o próximo mês, minha questão é:
“Considere um termômetro clínico. Quando a temperatura é medida, o mercúrio se expande. Por que o nível do mercúrio não cai imediatamente após você ter lido a temperatura?”
Lembrem-se: a melhor resposta ou talvez a análise da situação ganha um curso online!
Abraços e até o próximo mês.

Washington Braga Filho, PhD – wbraga@maua.mec.puc-rio.br
Professor Associado do Departamento de Engenharia Mecânica – PUC – Rio
Coordenador Administrativo da Rede Rio de Computadores / FAPERJ
Website: http://venus.rdc.puc-rio.br/wbraga/hpn.htm

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