A partir desse mês carros de passeio só poderão sair de fábricas com extintores da classe ABC, capazes de apagar princípios de incêndio na parte interna dos veículos.
Esta versão – com pó de monofosfato de amônia – apaga fogo em materiais sólidos, como plásticos, borrachas, espuma dos bancos, carpete e estofamento (que correspondem à categoria A), em combustíveis líquidos (categoria B) e não provoca curto-circuito (categoria de classificação C). Quem tem o extintor apenas BC terá de comprar um novo.
Atualmente, o extintor utilizado, do tipo “BC”, é capaz de apagar apenas incêndios no sistema elétrico ou de combustível dos veículos.
A resolução para a mudança foi tomada pelo Conselho Nacional de Trânsito, o CONTRAN, em 2003, baseada em estudos do Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo (Ipem).
Em 2001, o Ipem-SP coletou extintores de 59 oficinas de manutenção de São Paulo e de dois fabricantes de extintores para carro (Resil e Kidde, antiga Yanes).
O objetivo do trabalho foi o de avaliar a qualidade do extintor oferecido no comércio e a qualidade das oficinas de manutenção, que são os responsáveis pela recarga e inspeções dos extintores.
A conclusão foi que 58 oficinas foram reprovadas nos ensaios de funcionamento dos produtos.
Apenas uma oficina de manutenção e os dois fabricantes passaram nos testes aplicados. No Brasil, há 16 fábricas de extintores, mas apenas três produzem extintores de um quilograma para carros.
Dicas – Segundo dados do Ministério dos Transportes havia no país, em 2000, uma frota de 23 milhões 241 mil e 966 carros de passeio.
No estado de São Paulo, este número era de 9 milhões 301 mil e 665 veículos. Relacionando os números do Ministério dos Transportes aos dados encontrados pelo Ipem-SP, em 2001, foi possível concluir que:
O total de extintores com problemas (fora da conformidade), no Brasil, seria de 11 milhões 486 mil 179.
Só no estado de São Paulo este percentual chegou a 49,42%, ou seja, 4 milhões 596 mil 882 extintores teriam problemas.
Como é o novo extintor que poderia substituir o atual? Trata-se do modelo ABC, com pó de monofosfato de amônia (uma substância também usada como fertilizante).
Ele apaga fogo em materiais sólidos, como plásticos, borrachas, espuma dos bancos, carpete e estofamento (que correspondem à categoria A), em combustíveis líquidos (categoria B) e não provoca curto-circuito (categoria de classificação C).
É mais caro que o modelo BC (custa perto de 40 reais), mas a Abiex jura que o preço cairá se esse equipamento virar obrigatório.
Tem validade de cinco anos, contra três anos do tradicional comprado novo (35 reais) e um ano do tradicional recarregado (15 reais).
Segundo a Abiex, o segredo da longevidade não vem do pó, mas sim da vedação mais caprichada no cilindro.
A sugestão do novo extintor feita ao Contran também prevê o fim da recarga. Se for aprovada, entrará em vigor no meio de 2004. Junto com a mudança dos extintores, a proposta prevê cursos de treinamento.
• Quem ganharia com a mudança do extintor?
“Se é para ter extintor, que pelo menos seja um eficiente”, diz Saltini. O modelo ABC é mais seguro e, portanto, o público sai ganhando. A Abiex pode estar com a melhor das intenções ao pedir a mudança da lei mas não custa notar que ela também deve ganhar algum dinheiro com a mudança. Líderes da associação, as empresas Kidde e Yanes são as únicas fornecedoras de extintor para os carros novos. As montadoras dizem que pagam 10 reais por unidade, o que dá um faturamento bruto próximo de 14 milhões de reais. Com o fim da reciclagem, as empresas ganhariam também o público que hoje recarrega o extintor. Segundo o Sindincêndio, são cerca de 7 milhões de consumidores. O sindicato também quer o extintor ABC, mas faz restrições ao fim da reciclagem: “Os cilindros são feitos para serem recarregados, esse é um direito do público”, diz Irineu Büller.
• Quem ganharia com o fim do extintor obrigatório?
Para quem acha o extintor uma inutilidade, a abolição seria o fim de uma despesa e de um aborrecimento na hora de recarregá-lo no posto. Quem gosta poderia continuar com o equipamento em dia, indiferente à mudança.
As montadoras ficariam livres de comprar os extintores – uma bela economia, se lembrarmos que até lâmpadas de ré têm entrado na contenção de despesas.
• Em que países o extintor é obrigatório?
Só países chamados de “emergentes” exigem: Argentina, Bulgária, Costa Rica, El Salvador, Chile, Guatemala…
Na maioria dos lugares, o uso do extintor é optativo. É o caso da China, Índia, Paraguai e Uruguai, além dos prósperos Alemanha, Bélgica, Canadá, Japão, Espanha, França, Noruega, Itália… Os dados são da AEA.
• A obrigatoriedade em países pobres prova que estamos certos?
Dá para interpretar de várias formas. Uma versão otimista: países pobres tendem a ter carros mal-conservados, que pegam fogo com maior freqüência.
E uma pessimista: países ricos têm governos menos sensíveis ao lobby de empresas que querem vender extintor. As duas são mera opinião para conversa de bar, escolha a sua.
Ou vamos a dois fatos que chamam a atenção: o extintor não é obrigatório na Suécia, país com uma das mais rigorosas e eficientes legislações de segurança no trânsito, nem nos Estados Unidos.
Os 50 estados americanos têm autonomia para criar essa lei, e nenhum deles quis.
• Por que o extintor não é obrigatório nos Estados Unidos?
O órgão americano responsável pela segurança viária (NHTSA) diz que não encontrou argumentos que justificassem a compra de 200 milhões de extintores.
E olha que eles procuram bastante: todo ano, o departamento nacional de estatísticas de transporte faz relatórios de quase 600 páginas.
Às vezes é doloroso manter essa posição contra o uso do extintor. Dia 29 de março, a advogada americana Alice Dee Rainville mandou uma carta pedindo pela obrigatoriedade.
A família dela tinha acabado de morrer em um incêndio de automóvel. O NHTSA respondeu que lamentava a perda, mas não mudaria uma linha em suas normas. Segundo eles, o risco de alguém se queimar tentando apagar o fogo não compensaria os benefícios.
Pelas estatísticas americanas, um incêndio acontece em 0,2% das colisões em geral e sobe para 2,9% dos acidentes fatais – ou seja, o choque foi tão forte que, provavelmente, os passageiros já teriam falecido antes de o fogo aparecer.
“Para resolver o problema dos incêndios, preferimos tornar mais rígidas nossas normas de resistência à colisão e contra o vazamento de combustível”, escreveu Jacqueline Glassman, chefe de conselho do NHTSA.
• Como nós estamos de equipamento preventivo?
Nos últimos crash test realizados com Gol, Palio, Corsa e Fiesta (deles, só o VW não mudou desde então), seguindo a norma americana.
Os carros bateram de frente em uma parede, a 50 km/h, e depois foram virados de cabeça para baixo. Nenhum deles deixou a gasolina vazar.
“Hoje, praticamente todos os carros brasileiros saem de fábrica com um sistema que interrompe a passagem de combustível em caso de colisão, chamado válvula inercial, e dispositivos que cortam a corrente elétrica”, diz Sérgio Ricardo Fabiano, gerente técnico do Cesvi (Centro de Experimentação e Segurança Viária), entidade privada que faz simulações de acidente para estimar o custo do conserto.
“Os modelos novos pegam fogo, mas a tendência é isso ficar cada vez mais raro.” Por outro lado, as inovações tecnológicas levam tempo para mudar o panorama do nosso trânsito. Nossa frota tem em média nove anos, segundo o sindicato nacional de produtores de autopeças (Sindipeças).
• Vale a pena apagar o fogo?
O risco de enfrentar as chamas compensa cada vez menos.
“Os carros modernos têm mais peças de plástico e componentes eletrônicos, as primeiras peças a estragar em caso de incêndio. Antes era possível reparar, mas está cada vez mais difícil”, diz o gerente do Cesvi Brasil. “O extintor parece o antigo kit de primeiros socorros. Ele era útil, mas pouca gente podia realmente tirar proveito.”
Tarcisio Dias – Gerente de conteúdo do Mecânica Online