A indústria automotiva global deve retomar os níveis pré-pandêmicos de produção só depois de 2025, no mais positivo dos cenários traçados em um estudo da Roland Berger e da Lazard divulgado neste mês.
Segundo a análise, a entrega de veículos novos, embora esteja em trajetória ascendente, devendo fechar 2022 com 80,6 milhões de unidades (os dados do quarto trimestre ainda não haviam sido consolidados) e 2023 com 84,9 milhões de veículos, a produção de automóveis novos deve seguir abaixo do patamar de 2018 (94,2 milhões) e se recuperar “apenas moderadamente” no curto prazo.
“A indústria automotiva encarou seu terceiro ano consecutivo [2022] sem recuperação de volumes”, diz o material. “No melhor dos casos, Roland Berger e Lazard não esperam o retorno da indústria automotiva aos níveis [de produtividade] pré-pandêmicos até 2025”, segue. “Na perspectiva de uma recessão global, no entanto, estes níveis podem ser retomados só daqui a alguns anos, mas não antes da próxima década, no mais restritivos dos cenários”, alerta o documento.
A análise tem por base os balanços de uma cesta de montadoras com receita anual entre 0,5 e 10 bilhões de euros, entre as quais se incluem as gigantes Volkswagen, BMW, Mercedes-Benz, GM, Ford, Toyota e Hyundai. Também considera dados financeiros de empresas de elos importantes do setor, como autopeças, transporte marítimo e semicondutores.
O estudo sugere que 2023 repetirá 2022, com vendas sob dura negociação, demanda reduzida e deterioração das margens em função da elevação dos custos com matérias-primas, energia e semicondutores, que explodiram na esteira da covid-19 e da guerra na Ucrânia, permanecendo sem perspectiva de baixar no curto prazo.
Ainda de acordo com a análise, a atuação de bancos centrais de todo mundo para conter a inflação elevando juros, além de diminuir a demanda por automóveis adquiridos a crédito, desfavorece a retomada do setor por encarecer o acesso ao capital num momento crítico, em que as montadoras precisam financiar a eletrificação de suas linhas.
Outro fator que pode limitar a recuperação nos próximos anos é a diminuição da oferta de mão de obra especializada, que, após as demissões realizadas do início da pandemia, não está sendo reposta, nem formada com a qualificação necessária à produção de carros elétricos com maior grau de tecnologia embarcada.
No curto prazo, as consultorias também veem como risco a continuidade da política chinesa de covid zero, baseada no lockdown de áreas residenciais e fabris, que, nas estimativas das empresas, tem potencial para reduzir a produção global de veículos em ao menos 1,5 milhão de unidades.
O estudo afirma ainda que uma possível guerra entre China e Taiwan pode, no limite, derrubar a produção de veículos em até 90%, conflito que, embora “pouco provável”, afetaria diretamente o setor, já que Tawain responde por 50% da produção global de semicondutores e 70% dos microcontroladores automotivos.
Margens – Mesmo com a produção de automóveis em tendência de alta, as consultorias prevêem que as margens das montadoras devem seguir sob pressão diante do cenário de custos produtivos em elevação, capital mais caro para financiar investimento e juros a pressionar as contas de montadoras e seus consumidores.
Na cesta de empresas analisadas, a margem EBIT (lucro deduzido de juros e impostos) média foi projetada para 2022 num intervalo muito próximo aos 5,3% alcançados em 2021, sendo as empresas com receita acima de 10 bilhões de euros e portfólio para vários segmentos as que devem publicar os melhores resultados finais.
A título de comparação, as autopeças devem entregar em 2022 margem EBIT média superior aos 9,1% de 2021, em função da demanda por peças, principalmente, de reposição. “Se as OEMs [fabricantes de equipamentos originais] estão conseguindo repassar custos às fabricantes, estas, por sua vez, não estão em posição de fazer o mesmo com seus clientes”.
Nesse cenário de pressão sobre margens, as consultorias entendem que as montadoras devem manter o foco nos veículos com as melhores margens e cancelar descontos ao consumidor, na direção contrária da prática atual de parte das empresas.
As consultorias dizem ainda que as montadoras devem continuar a buscar a ‘desglobalização’ de suas cadeias, blindando-as de disrupções, que, segundo sugere sua análise, serão mais frequentes daqui para frente.