Há sete anos, entrou em vigor o Código de Trânsito Brasileiro, com a promessa de resolver problemas com os quais os motoristas convivem no dia-a-dia. Mas não foi isso o que aconteceu
O ESTADO DE MINAS ouviu sete especialistas * – de diferentes área ligadas ao trânsito – para elegerem as sete principais falhas da aplicação do CTB.
Todos foram unânimes em reconhecer que a lei foi um avanço, reduzindo o número de acidentes e de vítimas, mas ainda falta muito para melhorar. Veja os pontos destacados pelos especialistas.
• Inspeção veicular
Discussão iniciada antes mesmo da publicação do CTB, onde foi prevista no artigo 104, a inspeção técnica veicular (ITV) se transformou numa novela.
O problema é que o enredo coloca em jogo a vida dos brasileiros, já que, como não há fiscalização para os veículos velhos, muitas vezes, sem condições de circular, o risco de acidentes e até mesmo de mortes é grande.
O desenrolar desta história ficou emperrado na burocracia dos órgãos competentes. Mas há também interesse de grandes grupos neste negócio lucrativo.
• Cinto de segurança
O CTB explica com todas as letras que o cinto de segurança é obrigatório para os ocupantes do veículo. Porém, motoristas e, principalmente, passageiros sem o equipamento obrigatório fazem parte da paisagem urbana.
Mais grave ainda é a falta de regulamentação dos cintos de segurança infantis (acima), que não têm uma legislação específica.
• Excesso de carga
Os buracos nas estradas têm um vilão, além da antiga falta de recursos e obras. No Brasil, 63% do transporte é feito pelas rodovias e o excesso de carga dos caminhões esburacam as vias, colocam a vida de motoristas em risco e emperram o desenvolvimento.
Os artigos 231 e 323 do CTB falam sobre pesagem e punição, mas falta regulamentação do Contran, equipamentos, balanças e fiscalização.
• Fiscalização rigorosa
Logo que foi publicado, o CTB reduziu em 45% o número de acidentes com vítimas nas estradas, principalmente devido ao anúncio de que a fiscalização seria para valer.
No entanto, com o passar dos anos, a divisão das obrigações entre as esferas federal, estadual e municipal deixou de ser uma ferramenta de desburocratização para se transformar no contrário.
O resultado é o descaso com as leis que ainda imperam e a sensação de impunidade dos maus motoristas.
• Pedestres, ciclistas e tração animal
Na opinião dos especialistas consultados, a idéia de municipalização da fiscalização, orientação e punição aos pedestres, ciclistas e condutores de veículos de tração animal não funcionou na prática. Muitas cidades ignoram o CTB e fazem com que a lei vire uma letra morta.
• Regulamentação de acessórios
O Contran elegeu uma série de prioridades controversas para regulamentação, enquanto deixou temas urgentes de fora. A proibição de tela de DVD e GPS nos automóveis, por exemplo, chegou antes de questões ligadas à segurança, como quebra-mato e engate bola (ao lado).
Outros assuntos também ficaram à deriva, como as películas refletivas, que têm legislação, mas não possuem equipamentos homologados para aferição e a regulamentação da emissão de ruídos, principalmente em relação a aparelhos de som.
• Educação para o trânsito
“Educação de trânsito é finalidade dos órgãos e entidades do setor”, conforme o artigo 5 do código. Na prática, o que se vê são órgãos de trânsito interessados mais em arrecadar do que educar, a despeito do que manda a lei. Exemplos não faltam: o malfadado kit de primeiros socorros, que sangrou o bolso dos motoristas e depois foi barrado. Parecia lobby de interessados em faturar.
Daniel Camargos e Paulo de Morais l NETRODAS
* Especialistas ouvidos: Fernando Pedrosa (Coordenador do Programa Pare, do Ministério dos Transportes, para as regiões Sul e Sudeste), Marcelo José Araújo (Cetran-PR), Celso Arruda (Universidade de Campinas), Mauri Adriano Panitz (PUC-RS e ex-DNER), David Duarte Lima (UnB e Instituto de Segurança do Trânsito), Adriana Castro (Crivo Avaliação Técnica Veicular), Rodolfo Rizzotto (Programa SOS Estradas).