Motoristas de grandes cidades procuram psicólogos para vencer uma fobia comum, o medo de dirigir
Fique aí, na sua. Estou saindo de casa para resolver a nossa relação.” Foi assim que a aposentada Neusa Theodoro, 53 anos, despediu-se de seu automóvel, um Palio zero-quilômetro, antes de se sentar no divã da psicóloga Cecília Bellina, na semana passada.
É o terceiro automóvel de Neusa, nos seus 23 anos de habilitação. É também mais uma tentativa de pegar no volante. Há uma década ela vive em ponto morto. Sofre de um mal que acomete milhares de pessoas nas grandes cidades: a fobia de dirigir. A neurose começou a ser estudada no início dos anos 70 e hoje é tratada em clínicas e auto-escolas especializadas. Propaga-se na mesma velocidade do aumento da frota de carros nas metrópoles. “É um problema sério e deve ser tratado”, assegura a psicóloga de Neusa.
De olho no mercado das neuroses, Cecília montou há três anos um centro de treinamento em São Paulo. De lá para cá ampliou o negócio e já ultrapassou a marca dos mil alunos, ou melhor, pacientes. Faz as sessões dentro do carro: no primeiro estágio, em um automóvel da auto-escola; no segundo, no carro do paciente. A maioria da clientela, mais de 90%, é formada por mulheres. “Os homens não têm coragem de assumir”, garante.
Na clínica do psicólogo paulista Salomão Rabinovich, também especializada em gente com fobia de dirigir, a clientela tem crescido 20% ao ano. Rabinovich nunca se sentou, como terapeuta, no banco do motorista no carro dos seus pacientes. “Ele precisa fazer tudo sozinho”, argumenta. Nos últimos tempos, vem recebendo propostas para franquear a clínica em Estados do Nordeste.
Primeiro passo do tratamento: descobrir a razão do trauma.
Passo seguinte: melhorar a auto-estima. Quem não dirige é considerado incapaz e motivo de piada. “As pessoas não entendem como eu prefiro pegar ônibus e metrô a enfrentar o volante”, diz a médica Sílvia Gaspar, 44, cuja rotina inclui três empregos. “O carro sempre foi meu inimigo.” Sílvia já deu partida na terapia e quer se livrar do pesadelo.
Foi o que aconteceu com Noeli de Oliveira, 40, uma auxiliar de escritório que passou um ano em tratamento. Tinha receio de ser xingada pelos outros motoristas. “Superei a timidez”, diz. Agora enfrenta a todos, a bordo de um Corsa, sem timidez.
Medos clássicos – As principais causas do trauma de dirigir
Receber críticas de outros motoristas, ser ofendido ou xingado nas ruas.
Perder repentinamente o controle do automóvel.
Subir ou descer ladeiras.
Ultrapassar caminhões e ônibus nas cidades, e qualquer veículo nas rodovias.
Dirigir na chuva ou sob neblina.
Esquecer o caminho e se perder na cidade.