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Atenção com a segurança de vôo!

Marcos Pontes – No mês de novembro, ao desembarcar em Guarulhos, São Paulo, para mais algumas semanas de trabalho para o Programa Espacial Brasileiro, observei que o aeroporto estava mais movimentado que o usual.

Fui informado que a situação era causada por um tipo de “greve” dos controladores de tráfego aéreo, os quais, de modo louvável e com vistas a aumentar a segurança de vôo, restringiam o número de vôos monitorados ao máximo adequado para cada controlador.

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O trabalho do controlador de vôo é, sem qualquer dúvida, essencial para que tenhamos vôos seguros.

O aumento natural do tráfego aéreo nas regiões mais populosas é uma grande preocupação das autoridades mundiais da área.

A NASA, já há algum tempo, desenvolve em San Jose, na Califórnia, um sistema futurístico de controle de trafego aéreo onde um supercomputador, conectado aos sistemas de navegação de solo e das aeronaves, calcula em tempo real todas as rotas de aproximação e partida do aeroporto.

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Com esses dados “em mãos”, ele envia comandos através dos instrumentos de navegação das aeronaves.

Os pilotos devem, então, simplesmente voar em um “túnel virtual” nas velocidades corretas, garantindo assim o espaçamento seguro entre os aviões.

O sistema parece interessante, não é? Contudo, assim como acontece com outros sistemas “automáticos”, que visam reduzir as possibilidades de erro humano em fases dinâmicas de operação, existem muitas regras, extremamente rígidas, para demonstrar que o equipamento é capaz de trabalhar nas diversas condições possíveis e com uma taxa de falha praticamente nula.

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É o receio natural de tirar o poder de raciocínio humano do procedimento. Outro exemplo desse “receio” é o sistema de pouso automático que equipa algumas das aeronaves mais modernas de transporte. Sistemas extremamente bem desenhados, porém ainda não autorizados para uso em todas as situações.

Portanto, fica claro que teremos a necessidade da operação humana ainda por muito tempo nas equipes operacionais. Normalmente essas equipes são compostas por mecânicos, operadores de solo, controladores, comissários e pilotos.

Para que o vôo ocorra com segurança, é necessário que todos os elementos do time trabalhem coordenadamente, com precisão e verificação mútua de possíveis erros de procedimento.

Note que existe um tipo de troca interessante nessa questão “operação automática” versus “operação humana”.

É extremamente difícil substituir o raciocínio humano em tempo real em todas as situações anormais e de emergência, contudo o ser humano é suscetível à falhas e erros de procedimento.

Então, a questão que fica é a seguinte: por que cometemos erros de procedimento? A resposta curta seria: justamente porque temos a capacidade de raciocinar! Irônico, não é? Isso significa que, no momento de executar um item de procedimento, nossa mente poderia estar “vagando” em outros pensamentos ou lugares. Como resultado da falta de atenção: erro de procedimento.

A perda de atenção pode ser causada por muitos fatores, isolados ou combinados. Grande parte dos estudos teóricos de prevenção ou análises resultantes da investigação de acidentes tenta identificar as suas causas.

Condições fisiológicas, medicamentos, treinamento inadequado, estresse e quebra de seqüência são algumas delas.

Nesse contexto, os grandes atrasos de decolagens, com os passageiros já embarcados, resultantes da operação limitada dos controladores, foram um fato que me causou certa apreensão com relação à segurança de vôo.

Eu mesmo tive a oportunidade de viver essa situação, em tempos passados e distintos, como piloto e passageiro.

Como passageiro, pude observar que o nível de estresse rapidamente crescia nos comissários à medida que os passageiros ficavam cada vez mais inquietos e irritados com o atraso e o desconforto do calor, visto que os motores não podiam ser acionados por falta de autorização ou restrição de combustível.

Pensando do lado dos pilotos, o atraso sempre ocorre entre duas linhas de procedimento.

Isso é uma grande chance de “quebra de seqüência”, em que um procedimento é interrompido por alguma razão e, ao retomá-lo, algum item pode ser esquecido, ou desfeito, ou ter tido parâmetros alterados.

Além disso, soma-se a irritação e o estresse do atraso também sobre os pilotos que, no mínimo por algum momento do vôo (partida, táxi, decolagem, subida, cruzeiro, procedimento de descida, aproximação, pouso, táxi e corte) estarão com um fator a mais na sua lista de preocupações: justificar, compensar, comentar, ou simplesmente “pensar” no atraso.

Uma coisa é certa. O mais importante é sempre a segurança, pois todo acidente aéreo nos impressiona e entristece. A perda de tantas vidas, de uma só vez, é sempre um fato duro, marcante.

Tenho trabalhado na área de prevenção e investigação de acidentes por quase duas décadas. Durante todo este tempo, testemunhei e aprendi muitas coisas.

Segurança de vôo é assim. É necessário um trabalho contínuo, baseado em confiança mútua. É uma estrutura delicada, construída dia-a-dia. Uma organização que precisa de todos.

A confiança, tão essencial, pode desmoronar a qualquer momento se algum dos participantes, aqueles que têm “a mão na massa”, sente-se ameaçado e deixa de contribuir com suas informações.

O frustrante é que sempre existe a possibilidade de um novo evento fatal, já que os riscos nunca serão nulos. Contudo, a cada nova descoberta e contribuição, nos aproximamos deste ideal.

Assim, a atenção redobrada e consciente nos procedimentos de todos os membros do time, o bom humor e a “cabeça fria” são, mais do que nunca, extremamente necessários para a segurança dos nossos vôos. Isso é a natureza humana. A maravilha do raciocínio e a possibilidade de erros!

O astronauta Marcos Pontes atua no Programa Espacial Brasileiro, é piloto militar e engenheiro aeronáutico, com experiência de 19 anos em segurança de vôo, trabalhando em campanhas de prevenção e investigação de acidentes aeronáuticos, incluindo o ônibus espacial Columbia.

*MARCOS PONTES – Natural de Bauru (SP), Pontes é mestre em Engenharia de Sistemas, graduado pela Naval Postgraduate School (Monterey, CA). Iniciou sua carreira profissional aos 14 anos como aluno do SENAI e eletricista aprendiz da RFFSA.

Ingressou na Academia da Força Aérea em 1981, permanecendo nos Esquadrões de Caça até 1988 com a qualificação de instrutor e líder de esquadrilha. É engenheiro aeronáutico, formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

Atuou como piloto de provas de aeronaves pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), em várias campanhas de ensaios, incluindo o primeiro míssil ar-ar brasileiro.

Conta com mais de 2.000 horas de vôo em 25 tipos de aeronaves, incluindo F-15, F-16, F-18, e MIG-29.

Tem experiência de 16 anos na área de segurança de vôo, trabalhando em diversas campanhas de prevenção e investigação de acidentes aeronáuticos, incluindo o ônibus espacial Columbia.

O tenente coronel Marcos Pontes foi selecionado pela Agência Espacial Brasileira (AEB), em julho de 1998, para representar o Brasil como astronauta no projeto da Estação Espacial Internacional (ISS) junto a 15 outros países.

O treinamento para astronautas foi realizado pela NASA, em Johnson Space Center, Houston,Texas.

Em dezembro de 2000, Marcos Pontes concluiu com sucesso o curso de astronauta e foi declarado oficialmente, pela Agência Americana, o primeiro astronauta brasileiro.

A partir daquela data, permaneceu em treinamento de prontidão operacional, aguardando escalação para vôo espacial, no quadro de astronautas da NASA.

Em 30 de março de 2006, Pontes decolou da base de lançamento de Baikonur, no Cazaquistão, para realizar a primeira missão espacial da história do Brasil.

Juntamente com o astronauta brasileiro, a bordo do foguete Russo Soyuz TMA 8, seguiram o cosmonauta russo Pavel V. Vinogradov, o astronauta americano Jeffrey N. Williams e 08 experimentos brasileiros para serem executados em ambiente de microgravidade a bordo da ISS.

Em 09 de abril de 2006, Pontes retornou à Terra tornando-se o 1º cosmonauta brasileiro a orbitar o planeta.

Pontes, atualmente, continua na NASA Johnson Space Center, em Houston, Texas, utilizando sua experiência de mais de 8 anos de conhecimento técnico e de relações internacionais no programa da Estação Espacial Internacional para ser um elemento de articulação em prol do Programa Espacial Brasileiro nas conversações entre a NASA, o SENAI-SP/FIESP e a AEB.

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